Abertura

Abertura

Procuro aquele que escreva no papel com palavras suspensas (como se fossem flores de lótus sobre a superfície das águas de onde nascem), com palavras acima de qualquer palavra "comum", mas sem se perder a simplicidade, em um movimento paradoxal e ascendente da escrita, onde o simples e o complexo se manifestem concomitantemente, sendo que novos sentidos e significados sejam traçados, ultrapassando os limites fixos para um momento de constante movimento, quebrando-se os paradigmas, desafiando-se a realidade.
Procuro aquele que descubra nas palavras algo que me faça perder a cabeça no deleite magistral do Belo, em ordenações desafiadoras, sendo necessária a suspensão voluntária ou involuntária da realidade para o entendimento e para o prazer de se desvendar o que se esconde entre suas linhas.
Procuro-o dentro dessa caixa cerrada como que se a qualquer momento a sua ausência fosse me consumir, mas sempre na esperança de encontrá-lo.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Lembranças

São apenas gotas,
lembranças de minutos
que preencheram minha vida.
Imagens que vêm arranhado paisagens,
desfigurando compassos
de notas surdas, morimbundas.
Então abra essa torneira
deixe a água sair e lavar
o que há para se lavar.

Bráulio Silva

domingo, 23 de novembro de 2014

Justo ele

Justo ele, que se criou sem pai
Agora em silencio se cala, sem filho
Talhado na infância e na velhice
Com os olhos duros e marejados
como espelhos que refletem o som do sussuro
"Eles não irão voltar"

Agora vejo caracóis de sentimentos
como vórtices de memórias
Que se vão
E o que fica?
...


Que se enterrem as lembranças no fundo do coração
Prossiga!

Bráulio Silva

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Coração

Meu coração é terra onde os poetas não põem os pés.
Tremem ao ouvir os sons das batidas.
Choram ao imaginar o que nele se forma.
Do meu coração eu sou poeta.

Bráulio Silva

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Estômago

Quem disse que é o coração que sente?
O que sente é o estômago.
Ele revira, embrulha, gela
Sossega!

Bráulio Silva

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Inconstância

Arrastar pesado de pés que pisam paisagens passadas
Dor retraída de retratos de tratos mal tratados
Fuga fugaz de encontros desencontrados
De amores vividos em tempos não amados

Olhar abismal que revela o irrevelável
De uma alma que ama sem ser amada
Foges de mim sentimento dito nobre
Será que é por não me achar nobre?
Ou será que é por ser eu nobre em um mundo não nobre?

Bráulio Silva

terça-feira, 22 de abril de 2014

Chuva

Lave as almas com seus cristais
Abra os peitos esculturais
das estátuas que me cercam

Faça brilhar todas as lanternas
petrificadas pela ignorância
de uma humanidade obsecada
pela fugacidade

Felizes, aprisionados,
realizados, acorrentados
conformados
com a pseudoalegria
uma euforia
que se desfaz como núvem
no fim do dia

Por trás das negras cortinas da conciência.
Haverá feras que não chorarão
Apenas rosnarão, morderão
Apenas!

Mas o Silêncio antecederá a queda
Do mistério a se desvelar
de que as feras também choram
quando o mundo é desmoronado

Lave tudo e a todos
Chuva de cristais

Bráulio Silva

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Visceral

Visceral é o olhar lançado,
a palavra dita,
o gesto articulado.

Viscerais são as tentativas
que vêm de dentro de mim
em busca de você.

Bráulio Silva

Esterilidade

Ovos estéreis
Caem do céu
Não se sabe de onde
Sobre este jovem lamaçal
A escorrer
Sobre um precioso deserto

Bráulio Silva

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Linha

Foguete de luz brilhante como uma serpente de fogo
Sonhos que se desfazem em púrpura cauda incandescente
Para que no estouro final desta subida
Todas as cores se refaçam novamente.

Bráulio Silva

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Luz do meu dia

Sorriso amargo que me ilumina
que reflete meus dias dilacerantes
Olhar noturno que me revela
para quem não me vê

Somente o espelho sabe a verdade
Das dores, das angústias sabe
Somente em minha presença vive
para me dizer silenciosamente o que sinto

Cadeados e correntes trancaram meu céu
Dentro de um afogamento abismal
uma tempestade encharcou minha alma
de sua ausência, de sua não existência

Só me resta esperar por você
Luz do meu dia

Bráulio Silva

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Aforismo I

Quem nunca se pegou diante de si mesmo, não se cabendo dentro do próprio corpo, da própria mente? Há momentos em que as coisas acontecem de uma forma tão grandiosa que parecemos gigantes de nós mesmos e se não soubermos aproveitar o que nos é oferecido podemos nos transformar em plugas. É preciso calma, é preciso alma para se movimentar neste labirinto que é a vida.

Bráulio silva

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Inspiração

Não há batalha
entre uma alma que insiste em derramar
e uma folha de papel que tenta resistir
quando a inspiração vem desses lindos faróis
que possuem a força de dez sois
iluminando meu caminho por entre águas
por vezes navegadas, porém fadadas
trazendo esperança para esse pescador
que carrega consigo apenas uma rede velha
em seu barco velho e desgastado
para o infinito incerto, na busca de um amor

Não há batalha nem sofrimento
Para se escrever algo que está em silêncio
Pois a inspiração que me vem muda
Que nasce da ausência de sua presença
Derrama em minha alma como chuva
Gotas de felicidade reluzentes
Que brilham pelas vertentes
Do aconchego de um colo imaginário
De uma conversa a se realizar
De um suspiro a se escutar

O desperdício da vida
Está no tempo não amado
No tempo em que não te vejo
No tempo em que não te sinto
Por isso não há batalha nem sofrimento
Para se escrever sobre a saudade
Que ainda está por vir
E sobre os momentos
Ainda por nascer

Bráulio Silva

Caixa preta

A cada dia que se passa descubro algo de "novo" nesta fonte inesgotável de mistérios que é a alma humana. E é neste mergulho silencioso e sem fim que me surpreendo com todos e comigo mesmo.

Bráulio Silva

quarta-feira, 18 de julho de 2012

O poeta


Estou para um mundo que não está para mim.
Na presente ausência, sucumbência?
Pareço aforgar-me em um mar de decadência!

Dentes, bocas e olhos, devorem-me agora!
Mesmo que devagar,
em pequenas fatias,
pedacinhos.
Que é para não engasgar,
pois sua boa digestão é fonte de minha existência.

Lenta antropofagia,
magra e sem vontade.
Apetite homeopático contra o imediatismo.
Que ainda há em alguns que buscam a verdade
nos versos, nas estrofes.
Mesmo que de uma forma bem magra,
pois o mundo está magro, muito magro.

Bráulio Silva

sábado, 16 de junho de 2012

Gota d'água

Não ser a gota d'água para o copo que está no limite para transbordar é muito importante, pois a pessoa que o segura sempre se lembrará de você como o causador de toda catástrofe.

Bráulio Silva

terça-feira, 15 de maio de 2012

Loucura


Erva daninha que me consome
pedras submersas, intocadas,
nas profundezas deste riacho
inexplorado, desconhecido.

Inconciência fantasmagórica
banhada pelo desespero, sofrimento,
alucinação.

Companheira de todas as horas,
de todas as almas.
Sem trégua trabalha
nos passos em falso
a espera de um empurrão
para se realizar.


segunda-feira, 26 de março de 2012

Cacto

Flamejante vida
a escorrer pelo horizonte
Vida que procura a vida
em um momento dissonante.

Bráulio Silva

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Vibrações


Às vezes me sinto fisgado, ferido
ao vê-las tristes, velhas, reclamonas
Sinto um chiar, um ranger na solidão
Súplicas pelo toque de uma mão

Então vibro dentro de vibrações
Onde o tempo sem tempo sorri melodias
e mesmo ao me deitar não deixo de ouvi-las
como ecos luminosos rasgando a escuridão

E ali, na madrugada ouço sussurros
Gotas de felicidade, alegria e gratidão
pelas belas notas
pelo singelo trimilique de cócegas
em um corpo tão lindo, fino e nu
a transformar trevas em luz

Bráulio Silva

terça-feira, 15 de novembro de 2011

A vela

Eram três as minhas formas
Pintadas na grande tela
Dançando comigo mesmo
No ritmo das chamas das velas

Eram duas as minhas formas
Pintadas na grande tela
Dançando comigo mesmo
No ritmo das chamas das velas

É apenas uma a minha forma
Pintada na grande tela
Dançando sozinho
No ritmo da chama da vela

Três, dois, um...
Antes muitos, agora um
Dançando sozinho e iluminado
No ritmo da minha chama da minha vela

Bráulio Silva

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Sx

Sou um poema
onde só cabem almas sintonizadas
na irracionalidade, na animalidade,
no instinto.

Um poema que canta
a junção espiritual,
a perda do controle,
a beleza feroz e voraz
de cada um

Um poema que caminha
contra o tabu
de não se falar
... sentir
... ouvir

Quero cantar
o que nos difere do que é divino
Quero cantá-lo
apenas por existir

E depois de cantá-lo ...
entre sons, murmúrios e gemidos
só nos restará tempo
para uma coisa

...
..., ...
..., ..., ...
..., ..., ..., ...

Bráulio Silva

terça-feira, 28 de junho de 2011

Vozes


- Bom dia!
- Bom dia! Mas é bom mesmo?
- Por enquanto não, mas vai melhorar. É porque estou com uma terrível dor de cabeça. Parece que fui castigado em meus sonhos. Parece que sai da cama sem me levantar verdadeiramente. É como se uma parte de mim continuasse dormindo e a outra viesse trabalhar.
- Sei como é. Já tive dias assim.
- Que dor...
- Calma, amigo. Calma. É apenas um sintoma que a maioria das pessoas não sente e quando sente não percebem qual é a causa, mas logo você vai descobrir o motivo de seu sofrimento.
- Tomara. E assim que descobrir cuidarei dessa “enfermidade”.
- Acredito que não seja possível a administração de um medicamento para o que sente. O agressor da sua integridade é externo e invisível, até para a mais poderosa lente. Diga-me. O que sentiu hoje quando acordou pela manhã?
- Senti um grande peso e havia uma imagem em meu pensamento. Era a imagem de várias pessoas batendo em mim, em minha cabeça, com grandes bastões feitos de palavras e letras que se desfaziam e vinham direto em minha direção.
- Continue.
- Logo depois estava mergulhado em um mar de palavras, de letras, de vozes. Afogava-me cada vez mais, deixando bem nas profundezas deste mar o verdadeiro Eu.
- Amigo. Isso é apenas um reflexo e uma pista para suas respostas. O que quero dizer é que nem eu, nem você, nem ninguém é quem realmente deveria ser.
- Amigo. Pode-se dizer que eu sou você. Que você sou eu. Que fazemos parte dos outros e os outros de nós. Somos apenas a reprodução das várias vozes. Vozes...

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Picaretada

Ao som estremecedor, penso
Por vezes me vi em pedaços
Como pedras neste pequeno espaço
Duro, seco, sem vida, penso
Que por vezes me vi em pedaços
De sorrisos que se foram
De olhares que me habitaram
De vozes mudas, imundas
Que ao sol e à chuva vi passar
Incomodados, atentos ao som da batida

Picareta desafiadora de toda dispersão
Centro de atenção
Frente a esse grande mundo quebrado
De emoção, sentimento e sensação

E entre todas essas pessoas defuntas
Que caminham juntas
Continuo com meu braço de picareta
Picaretada
Cavando rumo ao abismo do esquecimento
A imaginar
Quem sabe um dia irão se lembrar
Do som da picareta
A incomodar

sexta-feira, 11 de março de 2011

A morte do amor

Borboletas cristalizadas
Sem medo, sem rancor
Flores paralisadas
Pela angustia do amor

Lagos transpiram chamas
Céus suspiram rosas
Um mundo onírico se forma
Em um leito colorido, por hora!

A alegria, a paixão, o desejo
A tristeza, a fúria, o desprezo
Todos vieram, até o ódio apareceu
Para se despedirem, adeus!

E a pintura se desfez
Em rios turvos, acinzentados
E um grande vazio se formou
Na grande tela da vida, agora.

Bráulio Silva

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Silêncio


Nessas horas noturnas em que o silêncio devora tudo, ele sente o sussurrar dos mais belos versos, mesmo que alguns sejam intransponíveis às folhas de seu caderno. E a todo momento vem muitas formas indefinidas que o atormentam ou que lhe trazem paz nessa grandiosa alegria que é o trabalho com a escrita.
Silêncio sufocante que o desafia a em silêncio dizer algo que faça sentido silenciosamente.
Silêncio que não quer silenciar. Silêncio que acalma, que enfurece, que dá paz, que guia a caneta nas mais perfeitas curvas dentro de um plano nunca percorrido.
Mas aquela noite deveria receber um nome, “Noite do silencio”, pois o silêncio permaneceu calado, deixando-o sem suas formas, esterilizado.


Bráulio Silva

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Flores

Trazes flores com cheiro de lágrimas
Entre sussurros tão frios
Vejo a vida escorrer por caules cortados
[lágrimas]

Grandes olhos, gira-sois
Olhares que acompanham esse transitar fúnebre
Parabólicas de sentimentos

Impotentes, apenas trocamos olhares
Sob o véu negro que vem caindo
Com a promessa de uma aurora mais florida
[eterna]

Bráulio Silva